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  • Foto do escritorAdvocacia Badaró Randon

Evolução da Propriedade no Período do Brasil Colônia



Desde os primórdios da Civilização, ser dono de terras sempre foi de fundamental importância para o ser humano por várias razões significativas: para se ter segurança e abrigo, sustento e alimentação, com a aquisição e o uso eficaz da terra, começa o desenvolvimento de cidades e aparecimento de diversos povos.


A história da propriedade no Brasil é uma narrativa fascinante que não apenas reflete a evolução do nosso povo ao longo dos séculos, mas também esclarece sobre os desafios e oportunidades que enfrentamos atualmente. A relação com a terra moldou nossa identidade nacional e influenciou a nossa economia, política e cultura.


Convido a embarcar em uma jornada através do tempo, explorando como a propriedade evoluiu no Brasil, revelando segredos do passado que explicam os pensamentos atuais, temos a possibilidade de por quais motivos um instituto jurídico existe e como ele foi se adequando com o tempo nas relações sociais.


Os portugueses ao chegarem no Brasil tomam posse da vasta terra, as quais passam a ser da Coroa Portuguesa sob a égide da legislação das Ordenações Afonsinas, Filipinas e Manuelinas, e sucessivamente aplicadas, na Colônia. As terras eram pertencentes à Coroa e eram consideradas públicas e do Rei. Inicialmente, o interesse era a madeira existente no Brasil, pois os portugueses não acreditavam que houvesse outras riquezas aqui. Então houve o extrativismo do pau-brasil, madeira apreciada na Europa.


Por outro lado, os franceses se interessaram por nossa terra e vieram para cá para se apossar de territórios recém descobertos, passando a circular na costa brasileira. Daí, surge a necessidade dos portugueses em proteger “a propriedade pública” recém descoberta da Coroa da investida de outros povos europeus.


Era mais prático e barato fazer com que portugueses se estabelecessem na nova terra. A Coroa fatiou o novo território em faixas, dando-lhes o nome de Capitanias, e em 1534, as pessoas escolhidas pelo Rei de Portugal fixaram-se na faixa litorânea, respeitando o Tratado de Tordesilhas.


Os fidalgos portugueses recebiam a sesmaria (área de terra pública por doação) - as faixas de capitanias, eram donatários, não eram donos da terra e sim exerciam apenas o poder, o direito majestático dado pelo Rei. Normalmente essas terras eram oferecidas a pessoas ligadas à alta burguesia, nobreza, funcionários administrativos portugueses, militares ou banqueiros sendo que deveriam povoar, colonizar e legislar em sua faixa de área concedida pelo Rei. A única condição em que eles poderiam perder as terras era se não houvesse produção agrícola e utilização rentável da Capitania dentro de um prazo previamente estabelecido pela Coroa. Para isso, eles poderiam trazer mais pessoas, portugueses ou estrangeiros, num sistema de arrendamento dessas áreas das Capitanias visando a produção, detendo inclusive a permissão do Rei em escravizar os índios.


Os sesmários exerciam o usufruto das Sesmarias em cada Capitania, pois as terras pertenciam ao Rei, mas recebiam um documento real a Carta de Sesmaria. Muitos sesmários, que continuavam morando em Portugal, preferiram arrendar suas terras a pequenos lavradores para que cultivassem e explorassem a terra em nome deste.

A tributação era o dízimo sobre a légua de terra e o dinheiro entregue para a Ordem de Cristo, responsável pela arrecadação e entrega aos cofres reais.


A obrigação do Ouvidor-Mor era fiscalizar o cumprimento das leis e verificar se o sesmário cultivava a terra, condição resolutiva da doação. Se não cultivasse a terra e isso fosse comprovado para o Rei, essa faixa da Capitania era devolvida à Coroa, daí surgiu o termo TERRA DEVOLUTA (o domínio era devolvido à Coroa).


Instalou-se um sistema feudal e, em 1549, criaram um cadastro das sesmarias na sede de cada Capitania: havia um documento assinado de que o colono tinha uma área de terras. Inicialmente sem padronização, essa terra não era medida. Nesse período, surge formas rudimentares de medição e demarcação, a partir do século XVII, e que permaneceram assim até o século XIX. O medidor, pessoa que realizava a medição da terra a ser demarcada, utilizava-se de um cachimbo com fumo, acendia-o e montava no cavalo, deixando que o animal marchasse a passo. Quando o cachimbo se apagava, em razão do fumo ter se esgotado, marcava-se uma légua, momento em que o medidor fincava um pau no chão e, assim, estava delimitada o limite entre as áreas.


Entre os arrendatários havia a possibilidade de vender parte de sua área por documento escrito, e havia critérios a serem obedecidos pelos sesmeiros para que esses documentos fossem válidos.


Pessoas sem títulos escritos se ocupassem terras em direção ao interior, portanto se distanciando do litoral, procedia com a “Ocupação” de novas terras, e isso não era permitido pela Coroa Portuguesa, e era considerada irregular.


Mesmo os sesmeiros que possuíssem o documento válido emitido pelas autoridades, mas ocupassem terras e invadissem o interior também não eram reconhecidas pela Coroa.


Podemos perceber que a problemática sobre o reconhecimento da posse de uma pessoa sobre uma área não é tão nova assim, remonta o nosso passado. O uso e a exploração da terra essencialmente são para o indivíduo e sua família obterem segurança e abrigo, sustento e alimentação, mediante a aquisição e o uso eficaz da terra. E por sobrevivência e oportunidade de recomeço, alguns iam ocupando as terras da Coroa, e como não eram reconhecidos por esta, não pagavam os tributos. Vemos que a história se repete no tempo. Qualquer semelhança com a atualidade não é mera coincidência, pois ainda hoje parcela desfavorecida da população ocupam áreas que serão consideradas irregulares, não possuem o título sobre a terra. E desde 2017, já existem mecanismos para regularização de áreas ocupadas por inúmeras famílias pela Regularização Fundiária (REURB), mas isso já é um outro assunto.


Em 1695, a Coroa institui a obrigatoriedade de recolher o FORO (já que haviam ocupantes e sesmeiros na terra pública da Coroa), uma pensão por léguas de terras, além do dízimo pago à Ordem de Cristo.


Nesse cadastro do foro, passou a delimitar a área que cada um dos sesmeiros poderia receber. A solução encontrada pelos Sesmeiros foi cadastrar a porções da terra em nome dos seus filhos; assim nessa época curiosamente até criancinhas de colo já detinham um documento sobre a terra.


As expressões TERRA DEVOLUTAS e FORO ainda são utilizadas atualmente, porém com significado diverso do período histórico.


Ainda hoje a terra devoluta são bens públicos de domínio da União, Estado ou dos Municípios, porém são terras não destinadas nem aplicada a algum uso público. Essas terras poderão ser vendidas para particulares, consoante regras e exigências dispostas em leis para essa finalidade. Já o Foro, é a pensão que é devida pelo enfiteuta ou foreiro ao senhorio direto pelo gozo e utilização do domínio útil da área que lhe é atribuída. No Brasil as áreas que foram terras indígenas e hoje são de particulares devem pagar à União esse tributo, o qual é administrada pela Secretaria de Coordenação e Governança do Patrimônio da União - SPU.


A primeira judicialização para defender a posse de terra ocorre com MANOEL JOSÉ DOS REIS, o qual já estava há 20 anos se utilizando e explorando a terra. Contudo, a Coroa Portuguesa concede para uma outra pessoa a sesmaria de sua área. Para defender a posse de sua área, Manoel faz petitório para a MESA DO DESEMBARGO DO PAÇO, este criado em 1808, para o reconhecimento de que utilizava produtivamente aquela área e que aquela nova concessão não poderia ter ocorrido.


Em 1822 ficaram SUSPENSAS todas as concessões de sesmarias, proibido novas concessões. E em 1824, a Constituição do Império afirma que fica assegurada a propriedade sobre as terras. Somente com a Lei do Vigário em 1850, há o reconhecimento da propriedade dos particulares com emissão de títulos e as áreas públicas pertencentes à Coroa. E entramos em um novo período da história, e falaremos sobre isso numa próxima oportunidade.


Instagram: eliana.badaro.adv



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